terça-feira, 12 de junho de 2007

Contaminação

"Renda-se,
como eu me rendi.
Mergulhe no que você não conhece,
como eu mergulhei.
Não se preocupe em entender.
Viver ultrapassa todo o entendimento.”
(Clarice Lispector)


Estava pensando em contaminação. Em como podemos ser “contaminados” por alguém que mal conhecemos.
Todas as pessoas que encontramos nos deixam alguma marca, por menor que seja. O que certas vezes acontece é que algumas dessas pessoas deixam marcas indeléveis, e não conseguimos nem mesmo explicar o porquê.
Não estou falando de amigos, amores, familiares. Falo de pessoas que, em determinado momento das nossas vidas apareceram, por um breve instante (que pode ter sido um dia, ou uma semana), marcaram nosso coração e nunca mais conseguimos apagar a impressão deixada.
Pode ter sido pelo momento vivido, pela memória que aquele encontro traz, pelo cheiro que ficou, pelo gosto das lágrimas na boca... Muitas podem ser as razões.
Mas a verdade é que existem pessoas que nos contaminam. Deixam em nossa alma um rastro, uma marca, uma cicatriz...
Pode ter sido um amor de verão mal resolvido e, passados mais de 15 anos, ainda dói.
Pode ter sido uma noite num trem indo para Viena, antes do nascer do sol.
Pode ter sido um Carnaval em Salvador, com o sol ameaçando nascer...
Pode ter sido um encontro de duas línguas diferentes, dois mundos diferentes, e um mesmo desejo.
Pode ter sido uma noite de fantasia e vinho, guerreiro e princesa.
Tantas possibilidades, poucas explicações. Mas sentimentos não precisam de explicações.
Ainda que você tente racionalizar, não consegue entender como uma pessoa tão diferente de você, tão distante do seu universo, aquele alguém que apenas cruzou seu caminho por um belo e frágil momento, conseguiu deixar em seu coração tal impressão.
“Uma orquídea de fogo e lágrimas.”
E você se vê inundado por um sentimento desconhecido e ao mesmo tempo tão familiar. Pode sentir o desamparo e a dor do que não foi e poderia ter sido. Ou então a inexplicável sensação de ter sido sempre assim, daquela pessoa ter sempre feito parte da sua vida, parte de quem você foi...ou é.
É aí que você fecha os olhos, procurando resgatar cada um dos instantes passados, a poesia daqueles momentos, cada palavra, gesto, olhar, sensação. Você sabe que essas lembranças serão efêmeras e acredita que seus sentidos não serão capazes de preservar com nitidez todos os momentos vividos.
Mas de repente percebe que bastará a nota de uma música no ar, o gosto doce daquele café, o cheiro do mar em Ipanema, o toque na seda do vestido ou a visão daquele olhar para que tudo reacenda, todo o brilho volte e você possa agradecer ainda mais uma vez por ter vivido e por ter sido “contaminado” por alguém. E então entende que, naquele preciso momento, você amou.

Janaina Ferreira
Brasília, 20/03/2007

Um comentário:

Fabi disse...

Parece que sofremos do mesmo mal. Mas, é tão bom...